sexta-feira, 11 de outubro de 2013

PARTÍCULA DEUS OU PARTÍCULA DE DEUS?



“Desde os anos 60 do século passado, físicos teóricos punham a questão: como podem as partículas elementares sem massa que surgiram com o big bang ganharem massa, após trilionésimas fracções de segundo? Qual foi a partícula ou o campo energético que conferiu massa às partículas virtuais e assim fez irromper a matéria que compõe todo o universo?

Sabemos e, faço-o de forma extremamente pedestre, que a matéria (segundo Einstein é energia altamente condensada) é composta por partículas elementares: topquarks e leptões. Quando estes se unem dão origem aos protões e aos neutrões. Esses, por sua vez, unem-se e formam o núcleo atómico. Leptões, de carga negativa, são atraídos pelo núcleo atómico, com carga positiva e juntos formam os átomos. De átomos se compõem todos os seres existentes.

Portanto, topquarks e leptões são os tijolinhos básicos com os quais todo o universo e nós mesmos somos construídos. Junto com estas partículas elementares agem as quatro forças originárias que ordenam todo o universo, cuja natureza a ciência não conseguiu ainda decifrar. Elas atuam conjuntamente e respondem pela expansão, ordenação e complexificação de todo o processo cosmogónico: a força gravitacional, a electromagnética, a nuclear fraca e forte.

Peter Higgs (*1929) um tranquilo pesquisador de física teórica da universidade de Edimburgo no Reino Unido, sugeriu que deveria existir uma partícula, um bosão ou um campo energético, responsável pela massa de todas as partículas. O físico Leon Lederman (Nobel de Física) chamou-a de partícula de Deus. Outros denominaram-na de partícula Deus, porque ela é a criadora de toda a matéria do universo.

O que seria esse bosão Higgs ou campo Higgs? Os físicos imaginam-no como um fluido viscoso finíssimo que enche todo o universo, à semelhança do éter de Aristóteles e da física clássica. Quando as partículas elementares sem massa, puramente virtuais, tocam esse bosão ou interagem com o campo Higgs sofrem resistência, são travadas, pressionadas e consolidadas e destarte ganham massa e peso.

No dia 4 de Julho de 2012, no Grande Colisor de Hádrions entre a Suíça e a França, após acelerar partículas que colidiam, quase à velocidade da luz, os cientistas do Centro Europeu de Pesquisa Nuclear (CERN) identificaram uma partícula que preenche as características atribuídas ao bosão de Higgs. Supõe-se que seja ela ou outra partícula similar, mas que efectivamente confere massa às partículas elementares.

Esta verificação confirma o modelo standard do universo originado pelo big bang; daí a sua importância.

Mas, como entra Deus nisso tudo? Se dissermos que esta partícula é Deus, seguramente a teologia não o aceitaria, pois faria de Deus uma parte do universo. Ele é mais. É aquela Energia de Fundo, aquele Abismo possibilitador e sustentador do universo, que antecede ao big bang. Ele estaria além do “muro de Planck”, o limite intransponível, anterior ao tempo zero a partir do qual, em 10 na potência 43 de segundos após o big bang, teria surgido a matéria do universo. Atrás deste muro esconde-se aquela Energia poderosa e amorosa que origina tudo, inalcançável pela física mas acessível pela mística.

Se dissermos que o bosão de Higgs é a partícula de Deus podemos teologicamente aceitá-lo; seria o meio pelo qual Deus traria à existência as partículas materiais e assim todo o universo: um acto exclusivamente divino. Essa é a ontologia originária de Deus. A partícula de Deus mostra-nos como se cria tudo o que nos é dado ver. Filosófica e teologicamente diria: ela revela-nos como Deus fez surgir o mundo. E esse acto não se encontra no passado, mas realiza-se em cada momento e em todas as partes do universo e também em nós que estamos à mercê desta partícula de Deus. Caso contrário tudo deixaria de ser, voltaria ao nada”.

Leonardo Boff



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