José Saramago, quando escreveu o texto que a seguir transcrevo, não se referia, certamente, a este governo, pois não o conheceu como tal. Mas conhecia a estirpe e a massa de que são feitas as criaturas que o compõem. O mesmo tipo de gente que quer dar nas vistas, com uma vontade indómita de se insinuarem junto dos outros sem terem qualquer conteúdo válido para mostrar, a vacuidade dos seus parcos e limitados conhecimentos, a iliteracia política e social de que se revestem, a futilidade do seu discurso rebuscado e sem conteúdo, a falta de visão estratégica na governação, a capacidade destruidora do que está bem feito justificada pela necessidade de agir sem critério, "deitar fora o bebé com a água do banho" só porque tem de se agir…
De facto, José Saramago não conheceu este governo, mas, com a sua capacidade premonitória, caricaturou-o:
"Privatize-se Manchu Picchu, privatize-se Chan Chan, privatize-se a Capela Sistina, privatize-se o Partenon, privatize-se o Nuno Gonçalves, privatize-se a catedral de Chartres, privatize-se o 'Descimento da Cruz' de António da Crestalcore, privatize-se o Pórtico da Glória de Santiago de Compostela, privatize-se a cordilheira dos Andes, privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a núvem que passa, privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno e de olhos abertos. E finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas privadas, mediante concurso internacional. Aí se encontra a salvação do mundo... e, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a todos".
José Saramago - Cadernos de Lanzarote, Diário III, p. 148.
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