quarta-feira, 27 de agosto de 2014

IMPRENSA, POLÍTICOS E MARIONETAS




Um candidato a PM, por um partido que aspira a ser governo, tem a noção dos tempos e não gasta o seu latim pesado numa campanha prévia, numa disputa interna, um ano antes das eleições (João Miguel Tavares, aqui).

Um candidato a PM não se deve desgastar com promessas futuras, defesa de projectos à distância e apontar para resoluções a tomar daqui a mais de um ano, desconhecendo como estará a situação concreta dos acontecimentos, findo esse período de tempo – é muito tempo para analisar o comportamento do actual governo, sabendo a forma como trampolinam os factos e as realidades.

Um candidato a PM deve preocupar-se, isso sim (enquanto candidato, à distância de um ano), com a análise dos acontecimentos actuais, com a denúncia das iniquidades que afectam os cidadãos, com a competência e as provas dadas, promovendo, na análise dos eleitores, a antevisão da sua gestão, quando for PM.
Todavia, um óbice se nos apresenta – o veículo de divulgação. Esse veículo é, de um modo geral, a comunicação social, o tipo de jornalismo praticado e de comentadores escolhidos. Em suma, a manipulação da informação. Longe vai o tempo em que era condição suficiente para a verosimilhança da narrativa que determinado acontecimento ou facto tivesse sido veiculado pela televisão ou por determinado jornal.

Os jornalistas trabalham num regime de “liberdade vigiada”. A sua autonomia é limitada pelas posições editoriais que os profissionais da imprensa devem seguir. As notícias são elaboradas e editadas em redacções hierarquizadas que exercem forte coerção sobre quem produz e o que é produzido dentro delas. A imprensa histórica tem compromissos com os interesses corporativos e comerciais que ela deve acolher e isso compromete a sua credibilidade aos olhos da crítica e do público. (Luís Carlos Lopes [1])

Como escreve Estrela Serrano, no “Vai e Vem” (aqui), “uma explicação para esta súbita fixação dos jornalistas no “concreto” quando falam com António Costa está talvez no facto de pretenderem contrariar a ideia, corrente até há pouco, de que Costa tem “boa imprensa”. A demarcação surge então sob a forma de um jornalismo agressivo ou sob a (nova) forma de um jornalismo que, à falta de melhor termo, se pode chamar “jornalismo concreto”.

Como resolver…? – Não sei!

Todavia, quanto mais penso numa solução, mais me lembro de Guerra Junqueiro:

Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira a falsificação, da violência ao roubo, donde provem que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro. Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.
Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar” [2].






[1] Luís Carlos Lopes é professor adjunto IV do Departamento de Comunicação Social e membro do corpo permanente do Mestrado em Comunicação, Imagem e Informação do Instituto de Artes e Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense.
[2] Guerra Junqueiro, in “Pátria (1896)”

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