quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

O QUE É O TERRORISMO




É arriscado classificar o terrorismo somente como o exercício de actos violentos praticados contra as pessoas ou contra o seu património. Arriscaria dizer mesmo que estes não passam de actos gratuitos; uma atitude tomada num rasgo ideológico, como seja a oposição ao sistema neoliberal, temos facilidade em distingui-la de um acto terrorista. Nestes casos, é vulgar os manifestantes atentarem contra os seus símbolos e edifícios que os acolhem (como os bancos e associações representativas) – ilusoriamente pensam que destruindo as suas fachadas alcançarão o coração do sistema. Regra geral, estes grupos estão repletos de decepções, frustrações e amarguras, dando rédea larga ao seu estado anímico, através de acções destrutivas. Todavia, atitudes como estas não se transformam em “violência simbólica”, salvo no fim de um processo histórico-social, geralmente prolongado.

Poder-se-á classificar tais actos como actos ou expressão de terrorismo?

– Penso que não…!

O terrorismo tem por detrás um princípio exclusivista, quer seja de natureza religiosa quer seja de natureza política. Tudo serve para atingir os seus objectivos.

Tomemos como exemplo o atentado do 11 de Setembro de 2011, em Nova Iorque. Foi um gesto paradigmático do chamado terrorismo islâmico, contra os Estados Unidos da América. A partir daí o medo instalou-se em todo o País.

O medo produz fantasmas que desestabilizam as pessoas e a ordem instalada.

Por exemplo: um árabe em Nova Iorque pede informações a um polícia; este, de imediato, dá-lhe ordem de prisão, imaginando que é um terrorista. Mais tarde, depois de grandes complicações e de se comprovar que é um simples e pacífico cidadão inocente, soltam-no.

Esta fenomenologia mostra a singularidade do terrorismo: a ocupação das mentes, divergindo das guerras e das acções de guerrilha, em que a necessidade primária é a ocupação do espaço físico para se impor efectivamente.

No terror, basta ocupar as mentes com ameaças que produzam medo nas pessoas e nos seus governos.
A título de exemplo: Os norte-americanos ocuparam fisicamente o Afganistão dos talibãs e o Iraque de Saddam Hussein; mas a Al Qaeda ocupou psicologicamente as mentes dos norte-americanos, como previu Osama Bin Laden em 8 de Outubro de 2011 – “Os Estados Unidos não terão segurança, nunca mais; nunca mais terão paz”.

Para dominar as mentes através do medo, o terrorismo segue a seguinte estratégia:

1)           Os actos têm de ser espectaculares, caso contrário não causam uma comoção generalizada;
2)           Apesar de serem actos odiados, devem provocar admiração pela sagacidade empregada;
3)           Devem dar a entender que foram minuciosamente preparados;
4)           Devem ser imprevistos, para darem a impressão de serem incontroláveis;
5)           Os seus autores devem manter-se no anonimato (usar máscaras), pois quanto mais suspeitos, maior é o medo;
6)           Devem provocar o medo permanente;
7)           Devem alterar a percepção da realidade – qualquer coisa diferente pode configurar o terror.

De um modo formal: terrorismo é toda a violência espectacular, praticada com o propósito de ocupar as mentes com medo e pavor. O importante não é a violência em si mesmo, mas tão-somente o seu carácter espectacular, capaz de dominar as mentes de todos.

Há muitos actos que, pelo seu carácter destrutivo, têm rasgos de terrorismo, sem ser terrorismo propriamente dito. Se o tratarmos como terrorismo corremos o risco de instaurar medo na sociedade, medo que acaba inibindo as manifestações populares. Com medidas de carácter “antiterrorista” infundadas ou mal avaliadas, corremos o risco de favorecermos e facilitarmos as actividades clandestinas dos agitadores oportunistas, infiltrados em manifestações populares legítimas.

Mais importante do que saber quem cometeu e comete actos de violência é necessário saber o porquê do recurso à violência.

A nossa sociedade altamente desigual e discriminatória oferece sempre razões, motivos e pretextos para a indignação violenta. Cumprir e fazer cumprir a Constituição, possibilitar e facilitar a Educação, garantir a igualdade para todos é a melhor forma de se começar a eliminar os pretextos das manifestações “mais violentas”. Para isso é necessário ética, transparência e espírito de serviço e missão por parte quem tem a responsabilidade da governação.

A manipulação da informação é uma forma de terrorismo, praticada discricionariamente por muitos responsáveis governativos menos honestos, tendente à instalação do medo nas populações.

E, disto último, os portugueses já têm substancial conhecimento…



quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

OS DINHEIROS QUE VOS FAZEM BAJULAR O DÉSPOTA SÃO ROUBADOS…


O médico e exilado político guinéu-equatoriano Samuel Mba Mombe escreveu uma carta aberta ao Governo português, na qual expõe a sua “indignação, repulsa e consternação” pela aceitação da entrada da Guiné Equatorial na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em conselho extraordinário na passada sexta-feira.
Lembrando a “sistemática e flagrante violação dos direitos humanos na Guiné Equatorial”, Samuel Mba Mombe lamenta que “um país como Portugal, que um dia sofreu na própria pele os impactos de uma ditadura e que recebeu o apoio e a solidariedade de outros Estados, seja hoje o garante de uma cruel ditadura que sequestra, assassina, prende, tortura”.




Sua Excelência,

Pedro Passos Coelho

Primeiro-Ministro e Chefe do Governo de Portugal,

Excelência,
Segundo informações de fontes concordantes, o meu país, a Guiné Equatorial, foi admitido na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) com o aval do Governo de V. Ex.ª. Nós, guinéu-equatorianos, recebemos esta notícia com indignação, repulsa e consternação, ao constatar que o Governo que V. Ex.ª preside cedeu aos interesses económicos que, sem dúvida, jogaram o papel decisivo para que o nosso país seja aceite como membro de pleno direito nessa organização.

Ainda que já não nos surpreenda a hipocrisia dos Estados que se dizem democráticos, como é o caso de Portugal, a aceitação da ditadura de Teodoro Obiang Nguema pela comunidade de países lusófonos não faz mais do que confirmar a dupla moral destes Estados. Quando quase meio mundo condena a sistemática e flagrante violação dos direitos humanos na Guiné Equatorial, surpreende que Portugal, que já sofreu na própria carne os impactos de uma ditadura e que recebeu o apoio e solidariedade de outros Estados, seja hoje o defensor de uma cruel ditadura que sequestra, assassina, prende, tortura e não atende aos chamamentos da comunidade internacional para pôr fim às hostilidades contra o seu próprio povo.

Excelência,

O nosso povo já se acostumou a que Obiang, pelo poder do dinheiro, compre vontades. A sua aceitação na CPLP não foi uma excepção. O que temos de recordar é que estes dinheiros que vos fazem bajular o déspota são roubados ao povo da Guiné Equatorial. V. Ex.ª saberá certamente que este povo continua a definhar na miséria e na pobreza mais absolutas, apesar do petróleo, do gás e da madeira. É esta a crua realidade da Guiné Equatorial no momento em que o Governo de V. Ex.ª lhe abre as portas para ser membro de pleno direito da vossa comunidade.

Excelência,

Ao nosso sofrido povo, que durante quase 45 anos apenas conheceu regimes ditatoriais, resta-lhe tomar nota deste tipo de decisões. Como um império nunca dura 100 anos, algum dira recordaremos porque é que agora o que interessa aos ‘democratas’ ocidentais são as nossas riquezas, as riquezas que os déspotas que arruínam os nossos países lhes oferecem em bandeja, virando as costas aos sofrimentos de um povo que exige a liberdade de opinião, de manifestação, de expressão, de movimento, de eleições livres e transparentes. Em suma, um Estado baseado no respeito pelos direitos humanos e pela justiça social.

No momento em que escrevo esta carta, a pena de morte continua em vigor na República da Guiné Equatorial. E um ou outro assassinato acaba de cometer-se na sinistra prisão de Malabo.

Com alta consideração e estima pessoal,

Dr. Samuel Mba Mombe
Médico no activo e activista político”.


Os realces e os sublinhados são da nossa responsabilidade.


segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

NA IMINÊNCIA DE MAIS TRAFULHICES, A DÚVIDA SUBSISTE


O meu irmão Fernando expôs-me uma enorme e preocupante dúvida.
Ei-la:
“Como irá ser designado formal e oficialmente o n.º 1 do Conselho Nacional, escolhido pelo presidente do PSD?
Sr. Miguel Relvas?…
Dr. Miguel Relvas?…
Ex-Dr. Miguel Relvas?…
Não Dr. Miguel Relvas?…
Falso Dr. Miguel Relvas?…
Projecto de Dr. Miguel Relvas?…

Pago para ver…!



– E o Ministro de Educação, também pagará para ver…?
– Já terminou o processo iniciado para apurar a licenciatura do Sr. Relvas…?”

Francamente, não sei a resposta…!
De qualquer maneira vai haver chatice… Ai vai, vai!


segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

A TERNURA – A SEIVA DO AMOR




Mesmo no coração da actual crise social não podemos esquecer a ternura[1] que subjaz a todos os empreendimentos que envolvem valores e afectam o coração humano.

São misteriosos os caminhos que vão do coração de um homem na direcção do coração de uma mulher e do coração de uma mulher na direcção do coração de um homem. Igualmente misteriosas são as travessias do coração de dois homens e respectivamente de duas mulheres que se encontram e declaram seus mútuos afectos. Desse ir e vir nasce o enamoramento, o amor e por fim o casamento ou a união estável. Como temos a ver com liberdades, os parceiros se encontram inevitavelmente expostos a eventos imponderáveis.

A própria existência nunca é fixada uma vez por todas. Vive em permanente diálogo com o meio. Essa troca não deixa ninguém imune. Cada um vive exposto. Fidelidades mútuas são postas à prova. No matrimónio, passada a paixão, inicia-se a vida quotidiana com a sua rotina cinzenta. Ocorrem desencontros na convivência a dois. Irrompem paixões vulcânicas pelo fascínio de outra pessoa. Não raro, o êxtase é seguido de decepção. Há voltas, perdões, renovação de promessas e reconciliações. Sobejam, no entanto, feridas que, mesmo cicatrizadas, lembram que um dia sangraram.

O amor é uma chama viva que arde – “mas não se sente” – que pode bruxulear e lentamente cobrir-se de cinzas e até apagar-se. Não é que as pessoas se odeiem. Elas ficaram indiferentes umas com as outras. É a morte do amor.

Não basta o amor platónico, virtual ou à distância. O amor exige presença. Quer a figura concreta que é mais que o pele-a-pele mas, o cara-a-cara e o coração sentindo o palpitar do coração do outro.

Bem diz o místico poeta: o amor é uma doença que, nas minhas palavras, só se cura com aquilo que eu chamaria de ternura essencial. A ternura é a seiva do amor. “Se quiseres guardar, fortalecer, dar sustentabilidade ao amor sê terno para com o teu companheiro ou para com a tua companheira”. Sem o azeite da ternura não se alimenta a chama sagrada do amor. Apaga-se.

Que é a ternura? De saída, descartemos as concepções “psicológicas” e superficiais que identificam a ternura como mera emoção e excitação do sentimento face ao outro. A concentração só no sentimento gera o sentimentalismo. O sentimentalismo é um produto da subjectividade mal integrada. É o sujeito que se dobra sobre si mesmo e celebra as suas sensações que o outro provocou nele. Não sai de si mesmo.

Pelo contrário, a ternura irrompe quando a pessoa se descentra de si mesma, sai na direcção do outro, sente o outro como outro, participa da sua existência, deixa-se tocar pela sua história de vida. O outro marca o sujeito. Este demora-se no outro não pelas sensações que lhe produz, mas por amor, pelo apreço da sua pessoa e pela valorização da sua vida e luta. “Eu amo-te não porque és bela; és bela porque te amo”.

A ternura é o afecto que devotamos às pessoas em si mesmas. É o cuidado sem obsessão. A ternura não é efeminação e renúncia de rigor. É um afecto que, à sua maneira, nos abre ao conhecimento do outro. O Papa Francisco, no Rio de Janeiro, falando aos bispos latino-americanos presentes pediu-lhes “a revolução da ternura” como condição para um encontro pastoral verdadeiro.

Na verdade, só conhecemos bem quando nutrimos afecto e nos sentimos envolvidos com a pessoa com quem queremos estabelecer comunhão. A ternura pode e deve conviver com o extremo empenho por uma causa, como foi exemplarmente demonstrado pelo revolucionário absoluto Che Guevara (1928-1968). Dele guardamos a sentença inspiradora: “hay que endurecer, pero sin perder la ternura jamás”. A ternura inclui a criatividade e a auto-realização da pessoa junto e através da pessoa amada.

A relação de ternura não envolve angústia porque está liberta de procurar vantagens e de dominação. O enternecimento é a força própria do coração, é o desejo profundo de compartir caminhos. A angústia do outro é minha angústia, o seu sucesso é meu sucesso e a sua salvação ou perdição é minha salvação ou a minha perdição e, no fundo, não só a minha mas a de todos.

Blaise Pascal(1623-1662), filósofo e matemático francês do século XVII, introduziu uma distinção importante que nos ajuda a entender a ternura: o “esprit de finesse e o “esprit de géometrie”.

O “esprit de finesse” é o espírito de delicadeza, de sensibilidade, de cuidado e de ternura. O espírito não só pensa e raciocina; vai além, porque acrescenta ao raciocínio sensibilidade, intuição e capacidade de sentir em profundidade. Do “esprit de finesse” nasce o mundo das excelências, dos grandes sonhos, dos valores e dos compromissos para os quais vale despender energias e tempo.

O “esprit de géometrie” é o espírito calculador e obreiro, interessado na eficácia e no poder. Mas onde há concentração de poder aí não há ternura nem amor. Por isso pessoas autoritárias são duras e sem ternura e, às vezes, sem piedade. Mas é o modo-de-ser que imperou na modernidade, que coloca a um canto, sob muitas suspeitas, tudo o que tem a ver com o afecto e a ternura.

Daí se deriva também o vazio aterrador da nossa cultura “geométrica” com a sua profusão de sensações, mas sem experiências profundas; com um acumular fantástico de saberes, mas com parca sabedoria, com demasiado vigor da musculação, da sexualidade, dos artefactos de destruição mostrados nos serial killer mas sem ternura e cuidado de uns para com os outros, para com a Terra, para com os seus filhos e filhas, para com o futuro comum de todos.

O amor e a vida são frágeis. A sua força invencível vem da ternura com a qual os cercamos e sempre os alimentamos.




[1] Em Leonardo Boff, autor de A força da ternura; Mar de Ideias, Rio 2012.

sábado, 8 de fevereiro de 2014

DIREITOS DAS MINORIAS


  
O patriarca de Lisboa defende que os direitos das minorias devem ser referendados. D. Manuel Clemente concorda por isso que os portugueses se pronunciem sobre a adopção e co-adopção de crianças por casais do mesmo sexo.

O patriarca de Lisboa destacou, na sexta-feira à noite na TVI (no programa “Política Mesmo”, a importância de um amplo debate sobre o assunto (mais um Hugo Soares…!).

D. Manuel Clemente considera que não está a discriminar ninguém ao defender que se deve tratar de “forma diferente o que é diferente”, isto é, como lhe convier e a seu belo prazer.



“O que está em questão não é o direito de adoptar, mas sim o direito de a criança ter um pai e uma mãe” (que hipócrita – “um pai e uma mãe”; o superior interesse da criança não conta…?), começou por dizer D. Manuel (até que ponto é diferente do outro Manuel – o Cerejeira?).
Para ele, não importa a segurança da criança.


“Com certeza que se devem fazer referendos sobre os direitos das minorias”, reza, ainda, D. Manuel Clemente.

Aí concordo e proponho já um referendo: Considerando que o clero é, cada vez mais, uma minoria na nossa sociedade, “Acabe-se já com o celibato do clero”.

D. Manuel Clemente tomou posse do cargo de Patriarca e fez a entrada solene no Patriarcado a 7 de Julho de 2013. Augurava-se para breve a sua elevação à dignidade cardinalícia, que era tida como certa.

A sua indigitação fora feita pelo então Papa Bento XVI, o célebre Cardeal Joseph Aloisius Ratzinger, outrora prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé que sempre soube calar as minorias que “o contrariavam” (como, por exemplo, Leonardo Boff, um dos expoentes da Teologia da Libertação…).

Era tida, quase como certa, a sua elevação à dignidade cardinalícia; mas não foi. O Papa Francisco já anunciou os novos cardeais e passará a ter como conselheiros homens de partes do mundo que raramente ou nunca foram representadas no Colégio. Eram minorias, foram escolhidos e não houve referendo…! 

Desta lista não faz parte Manuel Clemente.

Percebe-se bem porquê: O Papa Francisco tem o saber dos Jesuítas, a humildade dos Franciscanos, a força do Evangelho e a coragem da Fé. Se continuar como se tem afirmado até agora, pessoas como Manuel Clemente nunca serão Cardeais.

Este Papa, para o Manuel, é (in)Clemente…

domingo, 2 de fevereiro de 2014

REFUNDAÇÃO




Não vou falar deste governo, de Paulo Portas, de Passos Coelho (e da sua “refundação”), desta maioria parlamentar (para lamentar) e de tudo o que os cerca...

Para esses, já dei…!

Quero contribuir, a exemplo do que fez o meu sogro José Morais nos últimos anos da sua vida (e em sua memória), com uma pequena reflexão sobre A revolução do “Sistema Igreja”.

Podemos não ser cristãos nem professar qualquer outra religião, contudo, teremos que reconhecer que a sociedade ocidental deve muito às religiões muçulmana e judaica – no âmbito das ciências – principalmente durante a grande noite das trevas que foi a Idade Média; mas, muito mais devemos à religião Cristã no âmbito das artes: a pintura, a escultura, a arquitectura, a música, a literatura, etc. Para tanto, bastará pensar na grandiosidade que foi o desenvolvimento da arte sacra ao longo da história e, com maior relevo, o grande movimento renascentista iniciado no Século XV, através dos grandes “revolucionários” da arte como por exemplo: Botticelli, Fra Angélico, Leonardo da Vinci, Masaccio, Piero della Francesca, Jan Van Eyck, Jan Gossaert Mabuse, Rafael Sanzio, El Greco, Donatello, Filippo Brunelleschi, Michelangelo, Giambologna, Donatello, Verrocchio, Francesco Laurana, Jacopo della Quercia, Guillaume Dufay, Gilles Binchois, Sir William Hawte, John Browne, Brunelleschi, Donato Bramante, Christopher Wren, Andrea Palladio, e tantos outros.
As revoluções não se fazem necessária e obrigatoriamente com armas. Exemplo é o que se está a passar na Igreja Católica com a intervenção deste Papa.
É neste sentido que penso (e quero acreditar) que podemos estar a assistir ao início de uma nova revolução social – do Sistema Igreja.

O Sistema político-económico necessita de líderes vencedores: uma cúpula implacável, penetrante, sempre renovada, de funcionários que não valem nem prestam para nada, senão para o “Dono”. Ao sistema não lhe importam os homens e muito menos os pobres (que não investem, nem compram), pois todas as pessoas (funcionários ou não) se substituem, em função do bom funcionamento e produção da máquina-sistema.
Estes funcionários, impessoais e eficazes, são Servos a soldo do capital, da empresa e do mercado, e o seu trabalho implica a eliminação e morte de milhões de pessoas, ignorados e excluídos, para bem dos privilegiados, os quais, por fim, tão-pouco importam, pois que só o sistema importa.
A Igreja não deveria necessitar de funcionários eficientes, nem de quadros-superiores (cf. Mc 9,33-37; 10,32-45) à maneira do sistema político-económico, pois não procura a eficácia administrativa ou económica do capital e do mercado, mas, tão-somente o encontro pessoal e directo com os homens (na linha dos ensinamentos de Jesus). Nessa linha, os ministros cristãos devem estar sempre abertos a todos, especialmente aos carentes de amor e de dignidade, aos excluídos do sistema político-económico, para os quais abre um espaço e um caminho. Por isso não deverá querer o dinheiro de César e o seu imposto (cf. Mc 12, 13-17), nem o dinheiro do rico que procura Jesus (cf. Mc 10, 17-22), pois a sua tarefa de comunicação entre os crentes (homens e mulheres), na Igreja, se situa a um nível de gratuitidade.

Funcionários e ministros
Aceita-se e compreende-se que a Igreja Católica tenha acabado, ao longo dos tempos, por ser contaminada pelo ambiente sacramental e cultural que a envolvia; todavia, ao fazê-lo correu o grave risco de perder a sua identidade messiânica, tornando-se num sistema sagrado. A burocracia sacerdotal da igreja foi imposta sob a influência do ambiente hierárquico judeu e helenista (romano), e assim se organizaram os ministérios como “ordens” de caracter sagrado – distinguindo a hierarquia, dos leigos –, e aplicando aos superiores hierárquicos (especialmente bispos) uma categoria ontológica do tipo sacerdotal, própria do Antigo Testamento e do ambiente pagão, mas não do Evangelho.
Alguns “ministros” funcionários da Igreja actuam como herdeiros dos funcionários hierárquicos romanos, a fim de manter a paz numa população civil ameaçada, controlando e compartilhando o poder dos reis, como impulsionadores e garantes da nova sociedade ocidental.
Estes “ministros sagrados”, estabelecidos como hierarquia, configuraram a história da Europa, até à chegada do modelo funcional e burocrático moderno.
Eram eficazes. Mas, mais que a sua forma de trabalhar, importava o seu ser (o seu valor ontológico sagrado): assim se guindaram como classe eleita, inviolável, nobreza espiritual de auréola divina a príncipes de um mundo que só se preocupa com principados. A Igreja Católica mantém, teoricamente, esse modelo e, desta forma, os seus ministros (principalmente os bispos) interpretam o modo de funcionar.
Os “ministros” de Jesus deveriam, tão-só, servir os homens e mulheres com transparência amorosa da sua vida.
A tradição, posterior ao próprio Evangelho, sacralizou o clero hierárquico a tal ponto que só pode haver eucaristia com um ministro “ordenado” de forma institucional. A tradição “inverteu” a experiência de Jesus e da Igreja primitiva que começava pelas diversas localidades (círculos de cristãos) a nomearem os seus próprios ministros. É, talvez, chegado o momento de inverter esta “inversão”, de modo a que o conjunto da Igreja (e não só a hierarquia) recupere a sua liberdade criadora, o seu sacerdócio de base.
Como diz Xabier Pikaza Ibarrondo no seu blogue, é fundamental recuperar esse sacerdócio de base para que, sempre que um grupo de cristãos se reúna, de boa-fé, em nome de Cristo, escute a sua palavra e invoque a sua memória no pão e no vinho partilhado, se possa e se deva afirmar que existe eucaristia, encarnação sacramental de Deus por Cristo, Igreja. Da forma como está instituída actualmente, essa eucaristia não será oficial se não estiver presente o bispo ou o padre em nome da igreja hierárquica.
O modelo actual da igreja hierárquica e burocrática, como cúpula sacramental que garante a unidade e a missão cristã, é secundário, para que se possa recuperar de novo a liberdade das primeiras igrejas cristãs que celebravam por si mesmas a eucaristia, em comunhão com outras igrejas (localidades, freguesias, concelhos, etc.). Nessa linha, a Grande Igreja só pode entender-se na forma de comunhão de comunidades autónomas, que aprendam a celebrar por si mesmas, escolhendo os seus próprios ministros.
É de supor que os bispos e presbíteros tenham vocação pessoal ligada à palavra de Cristo e ao “ministério” da Igreja; porém, a forma como se “ajeitam” a receber honras de “casta superior” faz com que corram o risco de se tornarem quadros superiores descaracterizados de uma burocracia centrada em Roma (Vaticano).
Este processo de burocratização faz parte da identidade do Ocidente, que se foi consolidado na Igreja, como entidade cultural e social diferenciada, a partir dos Séculos XI e XII, influenciando os modernos estados europeus com a sua dominação “legal”.
Como era inevitável, entre a Igreja e os estados surgiram conflitos de competência, de tal forma que ambos os “poderes” (religioso e secular) se mantiveram em crises permanentes de utilização e adversidades mútuas, desde as investiduras (Séc. XI – XII), passando pelas disputas conciliares (Séc. XV), até à ruptura protestante e às guerras posteriores (Séc. XVI – XVII). A culminar este cenário real, surge, a partir do Séc. XVIII, a ilustração racional, com a institucionalização da ciência e do capitalismo. O resultado daquelas lutas e processos somos nós, os ocidentais, com um passado cristão, um presente de globalização neoliberal e um futuro de comunicação gratuita ou de destruição massiva.

O Papa Francisco está, segundo a minha humilde opinião, no caminho certo para a realização desta revolução. Tem o saber dos Jesuítas, a humildade dos Franciscanos, a força do Evangelho e a coragem da Fé.
Não há respostas dadas, mas um caminho comum, não esquecendo o passado, mas sem o fechar, retornando ao mar largo do Evangelho, para entender a tradição e recriar a missão da Igreja. Neste contexto, para entender melhor a mudança necessária a operar.
Convém, ainda, relembrar a necessidade de abolir o “esquema das clientelas”. Esta forma de actuar foi importante no Império Romano. Aí, para mostrar a sua grandeza, os patronos de ordem superior (Senadores, Nobres…) e os novos-ricos procuravam os serviços de um determinado tipo de clientes que os apoiavam e, em compensação, recebiam os seus benefícios. Este esquema, aparentemente terminado (pelo menos em sentido histórico), mantém-se em certas posturas eclesiásticas, como se os leigos fossem clientes de uma hierarquia, da qual recebiam serviços espirituais.
Num mundo multiforme, onde as igrejas perderam a sua função oficial (apesar das concordatas), os clientes religiosos têm cada vez mais capacidade e vontade em eleger os ofícios sagrados e os patronos-ministros que melhor respondam às suas necessidades e opções, convertendo, assim, os serviços religiosos num supermercado. Logicamente, o mercado religioso deve cuidar e programar as suas ofertas, dentro dos grupos (religiões, igrejas, seitas…), para manter e aumentar as suas vendas. Mas, isso não é Evangelho.
Este sistema existia já na queda do império romano quando, ressequida e quase morta a religião tradicional, se multiplicaram as ofertas orientais, cultos misteriosos e grupos gnósticos, que acabaram por ser incapazes de saciar a sede do povo.
As crises de então deram origem ao triunfo do Cristianismo no Ocidente.
A Igreja Católica tem vindo a falar, desde há algum tempo, da necessidade de uma nova evangelização. Mas tudo parece indicar que os “poderosos da Igreja” não querem que se realize aquilo que apregoam. É normal procederem assim – perderiam privilégios.
Mas, o problema pode, também, estar na forma como se divulga o Evangelho que não responde à mensagem de Cristo, nem aos sinais dos tempos. O problema pode ainda ser dos mensageiros e da forma como o divulgam.

Num encontro com o Conselho Pontifício para os Leigos, que durante os últimos dias realizaram um simpósio sobre o tema, o Papa Francisco analisou as novas vias de divulgação do Evangelho.
Entre as possibilidades que oferece a comunicação digital, a mais importante é a da evangelização [mas], o anúncio [do evangelho] baseia-se em relações humanas autênticas e directas para desembocar num encontro pessoal com o Senhor”, assegurou o pontífice.
Francisco advertiu, não obstante, que “não se pode dizer que a presença da Igreja na internet seja inútil”.
É indispensável estar presente, sempre com estilo evangélico, nisto [internet], que sobretudo para os jovens, se converteu numa espécie de forma de vida, o lugar em que despertam as perguntas que têm no coração sobre o sentido da existência”, acrescentou.
O Papa advertiu ainda que os cristãos podem desiludir-se e deparar-se com perigos e “moedas falsas” na internet, mas recordou que haverá “preciosas possibilidades para guiar os homens até [...] Jesus”. (Ver aqui)

As revoluções, no Século XXI, fazem-se com o apoio das novas tecnologias e das redes sociais para, rapidamente, cortarem com todo o passado mesquinho, corrupto e oportunista.
Uma revolução para ser eficaz e para bem das pessoas é sempre um acto romântico, de abnegação e de coragem.

Como escreveu Leonardo Boff:
Até aqui falamos do factor religioso na sua natureza sadia. Mas ele pode ficar doente. Daí nasce a doença do fundamentalismo, do dogmatismo e da exclusividade da verdade. Mas toda doença remete à saúde. O factor religioso deve ser analisado a partir da sua saúde e não da sua doença. Então o factor religioso sadio torna-nos mais sensíveis e humanos. A sua volta sadia é urgente hoje, pois ajuda-nos a amar o invisível e tornar real aquilo que ainda não o é, mas pode vir a ser”.