sábado, 26 de outubro de 2024

Castelo de Soure

 




O Castelo de Soure terá sido edificado ainda antes do início da Fundação de Portugal.

 Numa primeira abordagem, por José Barbosa Canaes de Figueiredo Castelo-Branco este monumento terá sido construído no século IX, quando o Rei D. Afonso III, rei das Astúrias, concretizou a primeira reconquista de Coimbra e mandou construir uma linha de castelo em sua defesa, estes factos não foram posteriores a 883, época em que já existiam os castelos de Santa Eulália e Montemor-o-Velho, mas não há qualquer registo documental o testemunho arqueológico que testemunhe essa abordagem, apenas uma alusão á vitoria alcançada pelo rei de Oviedo, D. Afonso II (791-842), sobre os mouros, nas margens do rio Anços.

Numa segunda abordagem Salvado remonta a edificação (ou reconstrução) do Castelo de Soure após a segunda reconquista de Coimbra, em 1064, por D. Fernando I, o Magno, rei de Leão. Mais precisamente Salvado refere que o castelo terá sido erguido por D. Sesnado Davides, um moçárabe que ser terá tornado concelheiro de D. Fernando o Magno quando a reconquista de Coimbra.

O Castelo de Soure terá nascido nesta segunda abordagem, pela necessidade de organizar a defesa da cidade de Coimbra das investidas muçulmanas posicionadas a sul do Mondego. Surgem nessa altura seis castelos: Sta. Eulália (Montemor-o-Velho), Montemor-o-Velho, Soure, Penela, Miranda do Corvo e Lousã.

Construído na confluência de dois rios, o Anços e o Arunca este assumia uma enorme importância, porque permitia controlar: a antiga estrada romana Olisipo (Lisboa) – Aeminum (Coimbra) – Bracara Augusta (Braga), uma das estradas medievais mais utilizadas para as incursões, quer muçulmanas, quer cristãs; permitia também controlar o rio Arunca, que até à época medieval foi navegável por barcos de pequeno calado entre Soure e Alfarelos (junto ao rio Mondego), escoando por essa via os produtos da região (trigo, centeio, cevada, azeite, vinho, linho, cânhamo, mel, cera, caça e pesca). Soure era um ponto essencial em termos geoestratégicos para a defesa meridional de Coimbra.

A necessidade do garantir o controlo fluvial sobre o rio Arunca originou a sua edificação numa zona baixa, ao contrário de outros castelos. Tratava-se de um “Castelo de Muro” construído numa península protegida por dois rios. É difícil perceber como terá sido esta fortificação naquela época pois o seu estado actual apresenta-se alterado após muitos danos sofridos ao longo do tempo. Para o especialista em história militar medieval Mário Jorge Barroca, tendo por base os elementos arquitectónicos e arqueológicos existentes, a primeira edificação teria um formato rectangular conforme descrição com maior detalhe descrita por Mário Barroca, tendo por base um texto encomendado por D. Mendo Arias e redigido cerca de 1147-1150 por Salvado (monge de Sta Cruz).

Foi neste espaço que em Junho de 1111 D. Teresa e D Henrique outorgaram a Carta de Foral à Vila de Soure e incentiva a fixação de povos junto desta zona fronteiriça com os muçulmanos.

Esta estrutura ter-se-á mantido inalterada até 1116 quando os habitantes conhecedores da aproximação das forças almorávidas, que já tinham atacado, saqueado e destruído os castelos de Stª Eulália (junto a Montemor-o-Velho) e Miranda do Corvo, incendiaram o castelo e refugiaram-se em Coimbra, evitando assim que a fortaleza caísse nas mãos das forças muçulmanas e fosse utilizado como apoio a outras intervenções militares.

Em novembro de 1122, D. Teresa, viúva do Conde D. Henrique, numa tentativa de repovoar a vila abandonada e assegurar a defesa militar de Coimbra, doou o Castelo de Soure ao conde Fernão Peres de Trava (um nobre galego). O pouco interesse do conde galego levou a que D. teresa no ano seguinte doa-se novamente, em “préstamo”, ao cavaleiro Gonçalo Gonçalves (mordomo de D. Teresa em Viseu).

Em 1123 por determinação do bispo de Coimbra, Martinho de Áreas veio para Soure, como pároco, reconstruir a comunidade cristã. Martinho de Áreas terá então reparado a antiga igreja que estava abandonada em estado de ruína junto ao Castelo de Soure, dando-lhe o nome de Igreja de Santa Maria (em homenagem á terra de onde era proveniente o clérigo). Edificada junto ao Castelo porventura protegida por muralhas externas que formavam um Adro. Esta igreja possuía um arco que faria a comunicação entre o piso superior do castelo e o primeiro andar da igreja, que dispunha também de um telheiro. Esta igreja seria também conhecida como igreja de Santa Maria de Finisterra ou de Nossa senhora de Finisterra, hoje, apenas existem as ruinas deste monumento bem como algumas pedras encontradas em locais diversos nas proximidades.

Em 19 de março de 1128 D. Teresa entregou o Castelo de Soure à Ordem dos Templários. A Ordem dos Pobres Cavaleiros de Cristo foi fundada em Jerusalém em meados de 1118, por um grupo de cavaleiros de origem francesa, com o objectivo de proteger a Terra Santa dos ataques muçulmanos. Dez anos depois, em Janeiro de 1128, S. Bernardo de Claraval redige e a regra da Ordem do Templo que é promulgada no Concilio de Troyes, formalizando assim a Ordem do Templo. A 19 março de 1128, cerca de dois meses depois da Criação da Ordem, D. Teresa entrega o castelo de Soure aos Templários, tornando-se assim a primeira sede do Templo em Portugal e também um dos primeiros castelos possuídos pelos Templários na Europa. A sua localização numa zona meridional do Condado Portucalense foi estratégica no apoio á reconquista cristã. D. Teresa terá doado aos Templários todas as terras que estiveram sobre o domínio muçulmano desde Coimbra até Leiria. Um ano depois, D. Afonso Henriques confirmou essa doação e afirma-se no texto de doação como Irmão da Ordem

(…) esta doação faço, não por mando, ou persuasão de alguém, (…) e porque em a vossa Irmandade sou Irmão (…). Eu o Infante D. Afonso com a minha própria mão roboro esta carta.

(excerto da carta de doação de Soure por D. Afonso Henriques à Ordem dos Templários, 13 de Março de 1129).

Os Templários permaneceram no castelo de Soure, como sede da ordem, de 1128 até 1160-69.

O seu primeiro alcaide e mester da Ordem terá sido D. Guilherme Ricardo (cavaleiro franco), isto segundo frei Joaquim de Santa Viterbo, este mestre terá sido, ainda em 1128, substituído por D. Raymundo Bernardo.

O 2.º mestre D. Raymundo Bernardo terá dirigido a ordem e iniciado a reconstrução do castelo de Soure até 1140.

3.º mestre D. Pedro Froilar no ano de 1140 – 1143

4.º mestre D.Ugo de Martonio (Hugues de Montoire), de 1143 a1147

5.º mestre D. Pedro Arnaldo, de 1147-1157

6.º apartir de 1157 D. Gualdim de Paes

 

As tarefas desempenhadas pelos templários em Soure iniciaram-se em 1128 com o mestre D. Raymundo Bernardo.

A primeira tarefa foi a reconstrução do Castelo de Soure: Numa primeira fase com a construção de duas torres, uma a sudoeste e outra a sudeste, ambas de planta quadrada, uma das quias ainda existe nos nossos dias. A torre sobrevivente permitia o acesso ao segundo andar do castelo. Nesta torre foi usada na sua construção um ajimez, de origem árabe ou visigótica (depende do historiador), reaproveitado de um velho mosteiro de Soure, fundado pelo presbítero João e seus irmãos no início do seculo XI e por eles doado, em 1043, ao Mosteiro da Vacariça (este mosteiro terá sido arruinado em 1116 quando os habitantes se refugiaram em Coimbra utilizando a politica de terra queimada).

A segunda intervenção surge na década de 1140/1150 com a construção de uma Torre de Menagem. Com construção de planta sub-rectangular esta torre tem como principal característica individualizadora, a presença de um alambor, ou seja, uma estrutura de base reforçada e inclinada em rampa. Segundo Mário Jorge Barroca esta terá sido a primeira vez que os templários utilizaram esta técnica arquitectónica da defesa numa fortificação em Portugal, esta solução defensiva terá sido trazida da terra santa e introduzida nos castelos construídos pelos templários em território português.

“Para alem dos muros ainda hoje visíveis, o castelo teria um outro plano de muralha, uma espécie de cerca, que contornaria o espaço denominado Adro”. Ainda é visível junto à parede externa da Torre de Menagem, na proximidade da porta que dá acesso a alcáçova, o sito de arranque desse muro (“alias parte da entrada dessa muralha foi encontrada alguns anos durante as escavações para a construção de uma piscina a poucas dezenas de metros do castelo), Neste sentido, a fortificação seria constituída por duas áreas distintas: por um lado, uma cerca externa que protegia o núcleo original do povoado, nomeadamente a igreja de Santa Maria; por outro lado, a alcáçova, ou seja, a zona habitada pelos Templários e que englobava um espaço retangular com dois pisos, duas torres de defesa a sul e a torre de Menagem a nordeste.

Os templários organizaram militarmente e economicamente o território circunvizinho, pois eram os senhores dessas terras, que pertenciam a comenda sourense, e fundaram alguma povoações, como são exemplos a Ega (no concelho de Condeixa-a-Nova), a Redinha e Pombal (estas duas ultimas terá sido fundadas na década de 50 já no tempo de Gualdim de Paes, o responsável pela construção do castelo de Pombal).

Nos vales do rio Anços os Templários construíram moinhos hidráulicos em Paleão, Novos e dentro da vila de Soure, ao longo de uma levada – a do Ourão – por eles aberta. Ainda existe esta levada e alguns deste moinho embora já com alterações tecnológicas introduzidas no seculo XVI e XVII.

Em 1144, os Templários, travam a primeira batalha, aquando de uma incursão muçulmana àquela região e os cavaleiros templários são obrigados a intervir. Não correu muito bem pois perderam a batalha, muitos cavaleiros foram feitos prisioneiros, inclusive Martinho de Áreas o presbítero de Soure, e são levados para Santarém (nessa altura sobre domínio árabe). Esta derrota esta na origem de uma vitória, em Março de 1147, as tropas de D. Afonso Henriques saem de Coimbra com o objetivo de conquistar Santarém no caminho são reforçados por um contingente significativo de cavaleiros templários, liderados na altura por D. Ugo de Martonio que, na expectativa de resgatar os seus irmãos prisioneiros, vão ter um papel decisivo na conquista de Santarém e depois de Lisboa.

Com a conquista de Santarém e Lisboa a linha defensiva do reino passa a ser o Tejo e não o Mondego, os Templários mantem-se no castelo de Soure, mas, deslocam a sua sede para Sul, primeiro para Santarém e depois já no tempo de Gualdim de Pais para Tomar.

1217- Confirmação do foral de Soure por D. Afonso II e D. Urraca

1312, 22 Março – extinção da Ordem dos Templários, seguindo-se a incorporação dos seus bens na Coroa  e “Com a extinção da Ordem, os domínios de Soure e seu castelo passam para a Ordem de Cristo, através de Bula papal de 14 de Março de 1319, constituindo-se de imediato como cabeça de comenda.”

“Durante a crise de 1383-1385, a povoação e o seu castelo tomaram o partido pelo Mestre de Avis. Datarão do período subsequente, entre o século XV e o XVI, obras de reforma na defesa, conforme o testemunham a configuração das ameias e o segundo registo na torre Sul.”

A discrição do castelo de Soure que se encontra no Tombo da Villa de Soure, uma obra redigida em 1508, onde se revela uma estrutura militar que neste inicio de seculo (XVI), ainda se preservava num relativo bom estado de conservação. No entanto tratava-se de uma estrutura esvaziada de valor militar estratégico. Foram feitas obras de restauro realizadas por D. Manuel I.

1508 – consta no registo de bens móveis e imóveis, rendas, direitos e privilégios de que a Ordem era detentora, na vila de Soure, o castelo, casas, açougues, Igreja de Santa Maria de Finisterra, Igreja de Santiago (v. 0615090020), granjas de São Pedro da Várzea (v.0615090024), de São Tomé, de Alencarce de Baixo e do Ulmeiro (termo de Montemor-o-Velho, entre outras;

1834 – até esta data pertence à Ordem de Cristo; duas torres são vendidas por João Ramos Faria ao Conde de Verride, João Lobo Santiago Gouveia;

1880 – moradores dinamitam a torre SO. que ameaçava ruir.

 


quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

A IMPORTÂNCIA DO CÂNHAMO AO LONGO DOS TEMPOS



 

O cânhamo é uma planta da família das Cannabaceae, da mesma espécie da planta da maconha (Cannabis sativa), porém, cultivada de forma a ter baixos níveis de THC, o composto psicoactivo encontrado na maconha. No Século XV, o cânhamo era amplamente cultivado e utilizado por várias culturas ao redor do mundo devido às suas diversas aplicações.

Neste Século, o cânhamo era especialmente valorizado pelas suas fibras, que eram utilizadas na produção de tecidos, cordas, velas de navios, papel e outros materiais. As fibras de cânhamo eram conhecidas pela sua durabilidade e resistência, tornando-as ideais para uso em várias aplicações industriais e domésticas.

Além disso, o cânhamo também era utilizado na alimentação e na saúde. As sementes de cânhamo eram consumidas como alimento e eram consideradas nutritivas, ricas em proteínas, ácidos gordos essenciais, vitaminas e minerais. Óleos derivados do cânhamo também eram utilizados em preparações medicinais para tratamentos de diversas condições de saúde, embora as práticas e conhecimentos médicos da época fossem limitados em comparação com os de hoje.

Todavia, no Século XV, o cânhamo desempenhava um papel importante em várias áreas da vida quotidiana, desde a produção de materiais até o uso na alimentação e saúde.

Não há, contudo, evidências históricas concretas que comprovem o uso do cânhamo para mascar por parte dos marinheiros portugueses no Século XV. No entanto, é importante notar que o cânhamo tem sido utilizado ao longo da história de várias maneiras, incluindo como matéria-prima para cordas e tecidos, bem como para usos medicinais e recreativos.

É possível que, devido à presença do cânhamo em navios como matéria-prima para cordas e velas, algumas tripulações pudessem ter acesso à planta e potencialmente experimentá-la de diferentes maneiras, incluindo o mascar. O uso recreativo ou medicinal de cânhamo foi mais documentado outras culturas e períodos históricos.

O uso do cânhamo, tanto para fins recreativos quanto medicinais, tem uma longa história em várias culturas ao redor do mundo. Alguns exemplos incluem:


 

1.     China Antiga: O cânhamo é cultivado há milhares de anos na China, onde era utilizado para produção de tecidos, papel, alimentos e fins medicinais. Há evidências de que o cânhamo era utilizado como remédio para diversas condições de saúde.

2.    Índia Antiga: Na Índia, o cânhamo era cultivado e utilizado há milhares de anos, principalmente para fins medicinais e religiosos. No hinduísmo, o cânhamo é associado ao deus Shiva e é utilizado em rituais religiosos.

3.    Antigo Egipto: Os egípcios cultivavam cânhamo há milhares de anos para produção de tecidos, cordas e papel. O cânhamo também era utilizado com fins medicinais.

4.    Idade Média e Renascimento na Europa: Durante a Idade Média e o Renascimento, o cânhamo era uma cultura importante na Europa, sendo utilizado para produção de tecidos, cordas, velas e papel. Também era valorizado pelas suas propriedades medicinais e alimentícias.

5.     Séculos XVIII e XIX: O cânhamo era uma cultura comum na América do Norte, Europa e outras regiões durante os séculos XVIII e XIX. Nos Estados Unidos, por exemplo, o cânhamo era cultivado principalmente para produção de cordas e tecidos. Além disso, o cânhamo também era utilizado em preparações medicinais e, ocasionalmente, para fins recreativos.

6.    Século XX em diante: O uso recreativo e medicinal do cânhamo e de seus derivados, como o óleo de CBD, tornou-se mais difundido em muitas partes do mundo no século XX e continua até os dias actuais, à medida que mais pesquisas são realizadas sobre seus potenciais benefícios para a saúde.

 




quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

O rapto de D. Mécia, mulher de D. Sancho II

 




D. Mécia Lopes de Haro, filha de um dos mais influentes fidalgos hispânicos casara, no ano de 2031, com D. Álvaro Peres de Castro, de quem enviuvou em 1239. Mais tarde, esta – descendente de D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal – casou com D. Sancho II, contra a vontade da Igreja Católica e da própria Corte.

D. Sancho II, que governou entre 1223 e 1248, enfrentou vários desafios durante o seu reinado, incluindo conflitos com a nobreza e a Igreja.

O rapto de D. Mécia ocorreu em 1245, quando D. Sancho estava envolvido em conflitos com a nobreza portuguesa e a Igreja. O rei enfrentava oposição devido à sua administração e às suas políticas, e isso levou a um ambiente de instabilidade política.

Nesse contexto, D. Mécia, esposa de D. Sancho II, foi raptada.

O responsável pelo rapto foi D. Paio Correia, um nobre português que se opunha ao rei. D. Paio Correia era partidário do infante D. Afonso, meio-irmão de D. Sancho II, que tinha o apoio de muitos nobres descontentes com o governo do rei. O rapto de D. Mécia foi uma forma de pressionar D. Sancho II e enfraquecer ainda mais o seu governo.

A situação política em Portugal continuou a deteriorar-se e, em 1247, D. Sancho II foi deposto do trono pelo Papa Inocêncio IV, que apoiou a causa do infante D. Afonso. D. Sancho II retirou-se para o exílio em Toledo, onde morreu em 1248. O infante D. Afonso sucedeu-lhe como D. Afonso III, dando início a um novo capítulo na história de Portugal.

Infelizmente, as informações detalhadas sobre o destino de D. Mécia após o rapto são escassas na história registada. O foco dos registos históricos muitas vezes recai sobre os eventos políticos e figuras mais proeminentes, enquanto detalhes sobre figuras menos centrais, como as consortes reais, podem ser limitados.

Dado que D. Sancho II foi deposto em 1247 e morreu em 1248, é possível que D. Mécia tenha passado o resto de sua vida em circunstâncias menos favoráveis. A transição de poder e os conflitos políticos naquela época podem ter tido impacto na vida pessoal dos envolvidos, incluindo a família real.

D. Sancho II foi excomungado pelo Papa Inocêncio IV. A excomunhão ocorreu como parte das tensões entre o rei português e a Igreja Católica. O Papa Inocêncio IV, em 1247, emitiu uma bula de excomunhão contra D. Sancho II devido a desavenças e discordâncias entre o rei e a Igreja.

As razões exactas para a excomunhão incluíram questões relacionadas com a administração eclesiástica em Portugal, bem como disputas sobre terras e poder. D. Sancho II enfrentou oposição não apenas da Igreja, mas também de sectores da nobreza portuguesa.

A excomunhão foi um dos factores que contribuíram para a instabilidade política durante o reinado de D. Sancho II. Eventualmente, o Papa Inocêncio IV apoiou a causa do infante D. Afonso, meio-irmão de D. Sancho II, e contribuiu para a deposição do rei em 1247. D. Sancho II foi sucedido por D. Afonso III, que teve a aprovação papal. Este episódio ilustra a influência significativa da Igreja Católica na política medieval e nas dinâmicas de poder na época.

 




segunda-feira, 20 de novembro de 2023

NÃO SE COMPREENDE

 

 

 

Que sorte o mundo teve de, para a eleição do Papa Francisco, a Argentina não ter votado.

 

 


quarta-feira, 1 de novembro de 2023

Alguns apontamentos relativos à navegação no século XV e XVI


                                                                                                                                                                                                                                               

 

  

No século XVI, a China era um dos impérios mais poderosos do mundo, com uma rica história de inovação tecnológica, comércio e exploração. Enquanto a Europa estava apenas começando a despontar como uma potência global, a China já havia desenvolvido tecnologias avançadas em diversas áreas, incluindo a construção de embarcações de tamanho notável. Embora não existam registos históricos que confirmem a existência de um navio do tamanho de um porta-aviões moderno na China do século XVI, há evidências de que a China já havia produzido embarcações extraordinariamente grandes e impressionantes naquela época.

Durante o século XVI, a dinastia Ming (1368-1644) estava no poder na China. Este foi um período de notável crescimento e inovação, e a China destacou-se em várias áreas, incluindo ciência, tecnologia e exploração marítima. Sob o comando do “imperador Yongle”, a China lançou uma série de expedições navais conhecidas como as Grandes Viagens do Almirante Zheng He. Estas viagens ocorreram entre 1405 e 1433 e foram destinadas a explorar e estabelecer relações comerciais em todo o Oceano Índico e até mesmo em partes da costa leste da África.

As frotas de Zheng He eram compostas por uma série de enormes embarcações que eram verdadeiras maravilhas de engenharia naval. A maior delas, conhecida como o “Bao Chuan” ou “Tesouro do Dragão”, tinha um comprimento estimado de cerca de 137 metros e uma largura de aproximadamente 55 metros. Isso é impressionante por si só, mas o que torna essa embarcação ainda mais notável é o facto de que esses números se aproximam das dimensões de um porta-aviões moderno, embora a funcionalidade e o propósito fossem muito diferentes.

As Grandes Viagens de Zheng He eram missões de exploração, com o objectivo de estabelecer laços diplomáticos e comerciais com outras nações. As enormes embarcações de Zheng He tinham múltiplos convés, alojamentos luxuosos para a tripulação e dignitários, e podiam transportar grandes quantidades de mercadorias – tesouros, e presentes. Além disso, eram equipadas com sistemas de abastecimento de água, sistemas de ventilação e outros recursos que permitiam viagens longas e seguras pelo oceano. Algumas descrições sugerem que essas embarcações poderiam transportar tripulações de até mil pessoas.

Embora o “Bao Chuan” e outras embarcações das Grandes Viagens de Zheng He fossem incrivelmente grandes e avançadas para a sua época, é importante notar que elas não tinham a mesma funcionalidade de um porta-aviões moderno. Os porta-aviões são navios de guerra projectados para transportar aeronaves e realizar operações militares aéreas. Eles possuem pistas de descolagem e aterragem, sistemas de armas, e uma variedade de sistemas de comunicação e comando. As embarcações de Zheng He, por outro lado, eram mais voltadas para a exploração, com ênfase na capacidade de transportar pessoas, mercadorias e diplomatas em missões de comércio e políticas.

As Grandes Viagens de Zheng He foram uma demonstração impressionante do poder e da inovação da China do século XV, mas elas também representaram um esforço considerável que consumiu recursos substanciais. Após a morte do imperador Yongle, a China optou por interromper essas expedições em grande escala, redireccionando os seus recursos para outros projectos. Como resultado, os registos históricos posteriores sobre as embarcações de Zheng He se tornaram escassos, e as tecnologias e conhecimentos associados a essas frotas perderam – se em grande parte ao longo do tempo.

Em resumo, embora não existam evidências conclusivas de que um navio do tamanho de um porta-aviões moderno tenha existido na China do século XVI, as Grandes Viagens de Zheng He demonstram que a China daquela época era capaz de construir embarcações excepcionalmente grandes e avançadas para sua época. Essas embarcações eram notáveis não apenas pelo seu tamanho impressionante, mas também pela sua capacidade de realizar expedições marítimas de longo alcance e estabelecer laços com outras nações numa era de exploração global. A história das Grandes Viagens de Zheng He é um testemunho da riqueza cultural e tecnológica da China imperial do século XVI.

As embarcações utilizadas nas Grandes Viagens do Almirante Zheng He e as caravelas portuguesas do mesmo período representam duas abordagens muito diferentes em relação à construção naval e à exploração marítima. Aqui estão algumas comparações entre esses dois tipos de navios:

Os navios de Zheng He: As embarcações de Zheng He, como mencionado anteriormente, foram comissionadas pelo imperador Yongle da dinastia Ming para realizar expedições de exploração, comércio e diplomacia. O seu principal objectivo era estabelecer relações comerciais e diplomáticas com outras nações, além de explorar territórios desconhecidos.

As caravelas portuguesas: As caravelas eram embarcações de origem portuguesa desenvolvidas para a exploração marítima, mas o seu principal foco era a procura de rotas comerciais alternativas para as riquezas do Oriente, como especiarias. As caravelas também eram usadas para fins militares, como a expansão do império português.

Tamanho e Design:

Navios de Zheng He: As embarcações de Zheng He eram notáveis pelo seu tamanho impressionante, especialmente o “Bao Chuan”. Eram grandes, com vários conveses e podiam transportar grandes tripulações e cargas. Possuíam uma construção robusta e eram adaptados para viagens oceânicas de longa distância.

Caravelas portuguesas: As caravelas eram notavelmente menores em comparação com as embarcações de Zheng He. Eram embarcações de casco único, mais ágeis e adequadas para navegar em águas costeiras e oceânicas. Tinham uma estrutura mais leve e eram projectadas para serem manobráveis, tornando-as ideais para a exploração de rotas costeiras.

Tecnologia de Navegação:

Navios de Zheng He: As embarcações de Zheng He eram equipadas com avançadas tecnologias de navegação, como bússolas, astrolábios e sistemas de posicionamento estelar. Isso permitia que as expedições alcançassem destinos distantes com precisão.

Caravelas portuguesas: As caravelas também faziam uso de tecnologias de navegação, incluindo a bússola e instrumentos astronómicos, mas a sua exploração estava mais centrada em rotas oceânicas e navegação costeira.

Capacidade de Carga:

Navios de Zheng He: As embarcações de Zheng He tinham a capacidade de transportar grandes quantidades de carga, incluindo tesouros, presentes diplomáticos, mercadorias comerciais e suprimentos para longas viagens. Eram mais focadas na capacidade de transporte.

Caravelas portuguesas: As caravelas eram menores e tinham menos capacidade de carga em comparação com as embarcações de Zheng He. No entanto, eram adequadas para transportar cargas valiosas, como especiarias, em quantidades menores.

Destinos e Legado:

Navios de Zheng He: As Grandes Viagens de Zheng He exploraram rotas ao longo do Oceano Índico e alcançaram territórios na Ásia, África e até mesmo na costa leste africana. O legado dessas viagens influenciou as relações diplomáticas e comerciais entre a China e outras nações, mas a China eventualmente parou de investir em expedições marítimas em grande escala.

Caravelas portuguesas: As caravelas portuguesas desempenharam um papel crucial na Era dos Descobrimentos, explorando rotas que levariam ao estabelecimento de impérios coloniais portugueses em regiões como o Brasil, a África e as Índias Orientais. O legado das caravelas é significativo na história das viagens de descobrimento e na expansão europeia.

Em resumo, as embarcações de Zheng He e as caravelas portuguesas eram representativas das diferentes abordagens e objectivos das respectivas nações durante o século XVI. Enquanto as embarcações de Zheng He eram projectadas principalmente para exploração e diplomacia, as caravelas portuguesas eram centradas em encontrar rotas comerciais e estabelecer “impérios coloniais”. Ambas são testemunhas da notável engenharia naval e das conquistas marítimas da época.

 

 


terça-feira, 10 de outubro de 2023

Os Banhos Muçulmanos na Idade Média: O Poder das Águas e o Espaço Social (2)

 

 

Os Banhos Muçulmanos na Idade Média foram muito mais do que simples instalações de higiene. Eram centros de negócios restritos, onde as pessoas se reuniam para acompanhar transacções comerciais e estabelecer ligações sociais. Além disso, esses estabelecimentos desempenharam um papel importante na promoção da higiene pessoal e religiosa, atendendo às necessidades tanto físicas quanto espirituais da sociedade da época. Para as mulheres, os Hammams oferecem um espaço importante de convívio e de socialização, permitindo-lhes escapar das limitações de seus papéis tradicionais. Portanto, os Banhos Muçulmanos representam um aspecto fascinante e multifacetado da vida medieval, onde a sociedade reflecte a riqueza da cultura na Idade Média.

A Idade Média foi um período na história marcado por profundas transformações sociais, culturais e arquitectónicas. Nesse contexto, os Banhos Muçulmanos emergiram como elementos emblemáticos de uma sociedade dinâmica e rica em cultura, destacando-se não apenas como lugares de higiene, mas também como centros de negócios e convívio, onde as mulheres desempenhavam papéis cruciais. Nesta dissertação, exploraremos o papel dos banhos públicos muçulmanos na Idade Média, destacando as suas zonas de negócios e espaços de convívio feminino.

Os Banhos, conhecidos como “Hammams”, desempenharam um papel multifacetado nas sociedades muçulmanas da Idade Média. Originalmente introduzidos pelos romanos, esses estabelecimentos foram aprimorados e adaptados pelos muçulmanos ao longo dos séculos, tornando-se locais essenciais para a higiene e a socialização. No entanto, a sua importância é além disso, eficiente como zonas de negócios cruciais.

Inicialmente, os Hammams eram centros de comércio onde as pessoas se reuniam para realizar negócios e trocar informações. Comerciantes, artesãos e mercadores frequentemente visitavam esses locais para estabelecer conexões comerciais, adquirir bens e obter informações sobre tendências de mercado. Os banhos, portanto, não eram apenas locais para a limpeza do corpo, mas também onde se podiam “lavar” os negócios e as transacções comerciais.

Além disso, os “Hammams” oferecem um espaço importante para o convívio social. As pessoas reúnem-se para relaxar, conversar e fortalecer laços de amizade. Esses locais eram verdadeiros refúgios do stress do quotidiano, proporcionando um ambiente acolhedor e terapêutico. O calor, a humidade e as massagens oferecidas nos Hammams tinham benefícios tanto para o corpo quanto para a mente, tornando-os lugares ideais para a socialização.

As mulheres desempenhavam um papel fundamental nesses espaços sociais. Muitas vezes, os Hammams eram divididos por género, permitindo que as mulheres tivessem o seu próprio espaço de convívio. Isso era especialmente importante numa sociedade onde as mulheres tinham papéis socialmente definidos e, muitas vezes, ficavam confinadas aos limites do lar. Nos Hammams, onde as mulheres se pudiam reunir, compartilhar histórias e experiências, fortalecer os seus laços sociais e, por vezes, discutir assuntos importantes.

Os banhos públicos muçulmanos também desempenharam um papel crucial na promoção da higiene pessoal e colectiva. Numa época em que a medicina estava longe de ser tão avançada quanto hoje, a prática regular de banhos era vista como essencial para a saúde e o bem-estar. Os Hammams oferecem não apenas a oportunidade de lavar o corpo, mas também de relaxar e rejuvenescer, com vapor quente e massagens terapêuticas.

Além disso, a higiene era vista como uma parte essencial da fé islâmica. Um ritual de purificação, conhecido como "Wudu", envolve uma lavagem de partes específicas do corpo antes das orações. Os Hammams ofereciam um local adequado para esse ritual, permitindo que os muçulmanos cumprissem as suas obrigações religiosas de maneira adequada.

 


sábado, 30 de setembro de 2023

PORTUGAL NO SEU INÍCIO: ACASO OU UM PROJECTO

 



A história de Portugal é rica em eventos marcantes, desde a sua fundação até à sua influência global durante os Descobrimentos. No entanto, surge uma questão intrigante: o que foi Portugal no seu início? Foi resultado do acaso ou um projecto deliberado para transformar a História? Esta dissertação busca lançar luz sobre essa questão complexa.

Para compreender as origens de Portugal, é crucial contextualizar o período histórico. No início do segundo milénio, a Península Ibérica era um mosaico de culturas, com cristãos, muçulmanos e moçárabes coexistindo num território disputado. Nesse contexto, a formação de Portugal emerge como um enigma.

Uma teoria sugere que Portugal poderia ser um resultado do acaso. A Batalha de São Mamede em 1128, onde D. Afonso I (Afonso Henriques) derrotou a sua mãe, D. Teresa, e o conde galego Fernão Peres de Trava, é frequentemente citada como um marco. Afonso Henriques, proclamando-se como um líder independente, deu origem ao Condado Portucalense. Poderíamos argumentar que a ascensão de Portugal foi o resultado de eventos contingentes, como essa batalha e outros factores imprevisíveis.

Por outro lado, existe uma perspectiva que sustenta que Portugal foi um projecto deliberado. D. Afonso I não apenas proclamou a independência, mas também consolidou o território, promoveu o Cristianismo e fortaleceu a cultura local. A sua visão de um estado independente e cristão pode ser interpretada como um projecto consciente para transformar a História. Além disso, os tratados de Zamora e Badajoz, que definiram as fronteiras do Condado Portucalense, demonstram uma abordagem estratégica à expansão territorial.

A religião desempenhou um papel fundamental na formação de Portugal, pois a Igreja Católica apoiou a causa de Afonso Henriques, contribuindo para a consolidação do projecto português. A influência das cruzadas também moldou o contexto religioso e político da época.

A cultura e a identidade portuguesas também se desenvolveram nesse período. A língua portuguesa evoluiu, e a literatura trovadoresca, como as Cantigas de Amor, floresceu. Isso não parece ser mero acaso, mas sim um reflexo de um povo que estava a forjar a sua identidade cultural.

O impacto de Portugal na História é inegável. Durante os Descobrimentos, os exploradores portugueses como Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral, Bartolomeu Dias, Diogo Cão e outros desbravaram novas rotas marítimas e ampliaram o conhecimento do mundo. O Tratado de Tordesilhas dividiu o Novo Mundo entre Portugal e Espanha, consolidando o poder global de Portugal.

Portugal também difundiu a cultura e a língua portuguesa pelo mundo, deixando um legado duradouro em lugares tão distantes quanto o Brasil, Macau e Moçambique.

Em conclusão, a formação de Portugal foi um processo complexo que envolveu elementos de acaso e projecto deliberado. A Batalha de São Mamede e outros eventos imprevisíveis podem ter desempenhado um papel significativo, mas a visão e as acções de líderes como D. Afonso I foram fundamentais para a criação de Portugal como um projecto consciente para transformar a História. A história de Portugal é um testemunho da capacidade humana de moldar o destino por meio de decisões estratégicas e da busca de uma identidade cultural única, deixando um impacto duradouro no mundo.

 

Os Descobrimentos Portugueses

 

Reinado de D. João I (1385-1433)

1415 - Conquista de Ceuta

1418 - João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz descobrem a Ilha de Porto Santo

1419 - João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz descobrem a Ilha da Madeira

1427 - Diogo de Silves descobre as Ilhas dos Açores

 

Reinado de D. Duarte (1433-38)

1434 - Gil Eanes dobra o Cabo Bojador

 

Reinado de D. Afonso V (1438-1481)

1441 - Nuno Tristão conduz a expedição ao Cabo Branco, na Costa de África

1445 - Nuno Tristão conduz a expedição ao Senegal

 

Reinado de D. João II (1481-95)

1460 - Diogo Gomes descobre o arquipélago de Cabo Verde

1471 - Descoberta das ilhas de Fernão Pó, São Tomé, Príncipe e Ano Bom

1483 - Diogo Cão descobre a foz do Rio Congo

1485 - Diogo Cão chega à Namíbia

1488 - Bartolomeu Dias dobra o Cabo da Boa Esperança

 

Reinado de D. Manuel I (1495-1521)

1498 - Vasco da Gama descobre o Caminho Marítimo para a Índia

1500 - Pedro Álvares Cabral descobre o Brasil

1501 - Gaspar Corte Real chega à Terra Nova

1510 - Afonso de Albuquerque conquista Goa

1511 - Os navegadores portugueses chegam às Ilhas Molucas

1513 - Portugueses estabelecem feitorias na China, Macau e Cantão

1519 - O português Fernão de Magalhães inicia a primeira viagem de circum-navegação do globo, que termina em 1522

 

Reinado de D. João III (1521-57)

1543 - Os navegadores portugueses chegam ao Japão


terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Da correspondência com o Eduardo

 


Obrigado por elas – as notícias. São muitas e coloridas...

A gestão de conteúdos que os órgãos de comunicação social fazem não têm nada a ver com a difusão das mesmas. Estas empresas são meras gestoras de conteúdos. Não interessa o quê nem a quem se destina, desde que o produto se venda.

Por exemplo, hoje à hora do almoço, já não interessava a vacinação ou os problemas de saúde? Apareceu um novo produto que vendia mais – o terrorista informático. A pandemia foi esquecida. Não porque já tivesse passado, mas havia um produto que vendia melhor. Recolheram os jornalistas "especializados" em pandemias e fizeram avançar os especialistas em terrorismo informático. A merda é a mesma; mudou o título da especialidade dos estagiários... que são os mesmos.

Agora, ficamos com a indefinição da guerra da Rússia ou da Ucrânia. Que venham os economistas e os gestores de conteúdos para apontarem as estratégias a seguir. Ouçamos as interpretações (repetições) dos discursos dos políticos, porém traduzidas e interpretadas pelos gestores de conteúdos…


domingo, 14 de novembro de 2021

Para acabar de vez com o amor

 


Relativamente ao encontro internacional subordinada ao "COP 26" titula, Andreia Sanches, no editorial do Público, de 14 de Novembro p.p.: “O que dirão os netos deles deste ‘acordo imperfeito´”?

Respondo já: Não irão dizer nada, pois nada sentirão. Quem foi educado fora do amor não reconhece a falta de amor, nem de quem os educou, logo, não sabem o que é amor. Foram educados na preocupação exclusiva consigo e com os seus próprios interesses. Para eles, o amor, o respeito pelos outros e pela liberdade não os realiza. A família, porque não alimenta o seu egocentrismo, deixará de ter importância; valerá, tão somente o seu individualismo. Escusa, quando necessitar, pedir ajuda porque ninguém lhes ligará. E, mesmo as manifestações dos resquícios de amor serão somente instinto. Este acordo fracassado é mais um passo para acabar de vez com o amor ou então o amor já acabou.

No princípio a socialização estará somente ligada ao prazer individual e à procriação; depois, nem isso.

Toda esta impotência da humanidade serve para acabar de vez com o amor.

Talvez nem cheguemos a esta fase porque, entretanto, o mundo acaba.

 

domingo, 17 de janeiro de 2021

PARA QUANDO A IGUALDADE DE GÉNERO…?

 


A Igreja não é somente para homens.

«Uma questão que está sempre em estudo, sem nenhuma conclusão, é o papel das mulheres na Igreja e nos chamados ministérios ordenados como, por exemplo, o da presidência da Eucaristia.

O Papa Francisco acaba de publicar uma Carta Apostólica sob a forma de “Motu Proprio”, Spiritus Domini. É tão breve que se pode chamar um bilhete cheio de ironia. Diz que “Os leigos que tiverem a idade e as aptidões determinadas com decreto pela Conferência Episcopal, podem ser assumidos estavelmente, mediante o rito litúrgico estabelecido, nos ministérios de leitores e de acólitos; no entanto, tal concessão não lhes atribui o direito ao sustento ou à remuneração por parte da Igreja.”

Posso estar muito enganado, mas esta Carta é um exercício magnífico de ironia pastoral. Bergoglio tem-se esforçado por realçar que o lugar das mulheres na Igreja está muito desfasado em relação ao papel que desempenham na vida social, cultural, económica e política em muitos países. Homens e mulheres gozam cada vez mais, ainda com muitas distorções, dos mesmos direitos e deveres cívicos.

No entanto, o Papa Francisco esbarra com a Carta Apostólica de João Paulo II, Ordinatio Sacerdotalis (22.05.1994): “A ordenação sacerdotal, mediante a qual se transmite a função confiada por Cristo aos apóstolos, de ensinar, santificar e reger os fiéis, foi reservada sempre, na Igreja Católica, exclusivamente aos homens.” Esta Carta precisa de uma hermenêutica rigorosa que mostre que ela continua com as imagens de um mundo que está condenado a desaparecer. Ao publicar um Motu Proprio sobre o que já não precisava de nenhuma publicação, o Papa Francisco manifesta o ridículo da situação actual. 1»


Cristo não entregou a missão de divulgação do reino somente a homens; fê-lo, também e por excelência, a mulheres. Lembremos:

Maria Madalena, quando chegou ao sepulcro e não encontrou lá o corpo do Senhor, julgou que alguém O tinha levado e foi avisar os discípulos. Estes vieram também ao sepulcro, viram e acreditaram no que essa mulher lhes dissera. Destes está escrito logo a seguir: E regressaram os discípulos para sua casa. E depois acrescenta-se: Maria, porém, estava cá fora, junto do sepulcro, a chorar.

Estes factos levam-nos a considerar a grandeza do amor que inflamava a alma desta mulher, que não se afastava do sepulcro do Senhor, mesmo depois de se terem afastado os discípulos. Procurava a quem não encontrava, chorava enquanto buscava e, abrasada no fogo do amor, sentia a ardente saudade d’Aquele que pensava ter-lhe sido roubado. Por isso, só ela O viu então, porque só ela ficou a procurá-l’O. Na verdade, a eficácia das boas obras está na perseverança, como afirma também a voz da Verdade: Quem perseverar até ao fim será salvo.

Começou a buscar e não encontrou; continuou a procurar e finalmente encontrou. Os desejos foram aumentando com a espera e fizeram que chegasse a encontrar. Porque os desejos santos crescem com a demora; mas os que esfriam com a dilação não são desejos autênticos. Todas as pessoas que chegaram à verdade, conseguiram-no porque lhe dedicaram um amor ardente. Por isso afirmou David: A minha alma tem sede do Deus vivo; quando irei contemplar a face de Deus? Por isso também diz a Igreja no Cântico dos Cânticos: Estou ferida pelo amor. E ainda: A minha alma desfalece.

Mulher, porque choras? Quem procuras? É interrogada sobre a causa da sua dor, para que aumente o seu desejo e, ao mencionar ela o nome de quem procurava, mais se inflame no amor que Lhe tem.

Disse-lhe Jesus: Maria! Depois de a ter tratado pelo nome comum de “mulher”, sem que ela O tenha reconhecido, chamou-a pelo nome próprio. Foi como se lhe dissesse abertamente: “Reconhece Aquele que te conhece a ti. Não é de modo genérico que te conheço, mas pessoalmente”. Por isso Maria, ao ser chamada pelo seu nome, reconhece quem lhe falou; e imediatamente lhe chama “Rabbúni”, isto é, “Mestre”. Era Ele a quem procurava externamente e era Ele quem a ensinava interiormente a procurá-l’O e a divulgá-l’O.

 

Quase desde sempre as mulheres eram excluídas da sucessão. Quando contraiam matrimónio recebiam um dote, constituído de bens que seriam administrados pelo marido. O casamento era um pacto entre duas famílias, o seu objectivo era simplesmente a procriação. A mulher era, ao mesmo tempo, doada e recebida, como um ser passivo.

O marido que amasse excessivamente a sua esposa era visto como adúltero (luta constante entre o amor platónico e o amor físico/carnal, defendido, também, no Renascimento). Não deveria usá-la como se fosse uma prostituta. A mulher não podia tratar o marido como se ele fosse o seu amante. Através do casamento, o corpo da mulher passava a pertencer ao seu esposo. Mas a alma dela deveria sempre permanecer na posse de Deus.

Para a maioria dos pensadores da IdadeMédia, a palavra latina que designava o sexo masculino – Vir –, lembrava-lhes “Virtus”, isto é, força, rectidão, virtude. Para Mulier, o termo que designava o sexo feminino lembrava –Mollitia –, relacionada à fraqueza, à flexibilidade e à simulação.

A mulher deveria ser vista como submissa, pois, era temida. Considerava-se que a mulher era o pecado, a carne fraca. O casamento não tinha, como objectivo unir pessoas que se amassem, ou dar prazer a alguma das partes, mas sim o propósito da procriação.

A mulher, quando se casava, simplesmente trocava de homem ao qual tinha de se submeter – de pai para, depois, marido.

A prostituição era considerada um “mal necessário”, pois curava vontades de jovens e clérigos, mas ainda assim as prostitutas eram, tal como ainda hoje, marginalizadas da sociedade.

Em algumas doutrinas diferentes do catolicismo a mulher poderia ter os mesmos direitos que os homens; todavia, embora a religião tenha evoluído bastante a partir da contra-reforma, a mulher continuava a ser discriminada pela Igreja.

Parece que o Papa Francisco continua solitário nesta grande tarefa. Creio, contudo, que a igualdade de género está para breve. Cristo escolheu uma mulher – Maria Madalena – para testemunhar a sua ressurreição e divulgar aos outros apóstolos este feito, em primeira mão.



 1-Frei Bento Domingues O.P., in Público. Domingo, 17 de Janeiro de 2021

domingo, 15 de março de 2020

A maior revolução religiosa





A maior revolução religiosa


Frei Bento Domingues O.P.

A conversa sobre o papel das mulheres na Igreja não avança porque não se liga nada à importância que Jesus lhes atribuiu

1 É muito complexa a história do povo samaritano. Segundo a investigação de 2019, existiam apenas 820 samaritanos. Parece que num passado remoto ultrapassaram o milhão [1]. Apesar da sua reduzida expressão numérica actual, a liturgia cristã não os pode esquecer. Ao longo do ano litúrgico, são muitas as referências, extremamente simpáticas, dedicadas a esse povo semita que era detestado pelos judeus por ter conservado, da herança comum, apenas o Pentateuco e ter levantado um lugar de culto rival do templo de Jerusalém. Mas porque será que os textos do Novo Testamento construíram, por contraste, figuras samaritanas que apresentam como exemplares para todos os tempos e lugares?
Esses textos não são as actas factuais do comportamento de Jesus de Nazaré. São interpretações contextuais dos seus atrevimentos, mas não há dúvida de que este galileu insólito não suportava aquele ódio fratricida nem a justiça do olho por olho, dente por dente [2]. Esses textos de inapagável beleza atribuem a um judeu a apresentação de figuras samaritanas — figuras de um povo rival — como exemplo do que deve ser um discípulo da Lei Nova do Evangelho. O Nazareno não fazia acepção de pessoas. Tanto curava judeus como samaritanos ou gentios. Eram doentes, e só por isso deviam ser socorridos sem mais considerações. Mesmo assim, destaca que entre os dez leprosos curados só um samaritano veio agradecer.
Segundo o Evangelho de S. Mateus, quem mais precisava de conversão era Israel e, por isso, é em primeiro lugar às ovelhas perdidas deste povo que se dirige a intervenção de Jesus [3]. Paulo também começou a sua pregação pelas sinagogas, pelos judeus. Mas depressa descobriu que, em Jesus, não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem nem mulher, não há circunciso e incircunciso, bárbaro, cita, escravo ou livre. O que importa é que a vida e a mensagem de Cristo sejam tudo em todos [4]. Existem, no entanto, narrativas de ruptura, de natureza altamente simbólica, que são dedicadas a exaltar figuras samaritanas. Comecemos por uma que é proclamada, hoje, na Eucaristia e constitui uma radical revolução religiosa. Pertence ao capítulo 4.º do Evangelho de S. João e está disponível online.
2. Jesus estava de viagem e parou, em Sicar, cidade da Samaria, enquanto os discípulos foram procurar alimentos. Estava cansado, sozinho, com muita sede e sentou-se junto do famoso poço de Jacob de profundidade excepcional (32 metros!), com água sempre fresca mesmo sob o sol escaldante do meio-dia.
Entretanto, veio uma mulher da Samaria para tirar água. Disse-lhe Jesus: Dá-me de beber. A samaritana espantou-se: Como é que Tu, sendo judeu, me pedes de beber, a mim, que sou samaritana? Jesus muda de registo. Se conhecesses o dom que Deus tem para dar e quem te pede: dá-me de beber, tu é que lhe pedirias, e Ele dar-te-ia água viva! A mulher goza com esse despropósito: Senhor, não tens sequer um balde e o poço é fundo... Onde consegues, então, a água viva? Porventura és mais do que o nosso patriarca Jacob, que nos deu este poço donde beberam ele, os seus filhos e os seus rebanhos?
Jesus retoma a iniciativa: Todo aquele que bebe desta água voltará a ter sede; mas quem beber da água que Eu lhe der nunca mais terá sede: a água que Eu lhe der há-de tornar-se nele em fonte de água que dá a vida eterna. A mulher aproveita a deixa: Senhor, dá-me dessa água, para eu não ter sede, nem ter de vir cá tirá-la.
Como não era bem visto falar com uma mulher em público sem o marido, Jesus diz-lhe: Vai, chama o teu marido e volta cá. A mulher retorquiu-lhe: Não tenho marido. Jesus revela a situação real desta samaritana extraordinária: Disseste bem: não tenho marido, pois tiveste cinco e o que tens agora não é teu marido. Nisto falaste verdade. A mulher não se deu por achada: Vejo que és um profeta! Então explica-me: Os nossos antepassados adoraram a Deus neste monte, e vós dizeis que o lugar onde se deve adorar está em Jerusalém.
3. Começa a revolução: Jesus declarou-lhe: Mulher, acredita em mim: chegou a hora em que, nem neste monte nem em Jerusalém, haveis de adorar o Pai.
Ainda tentou afirmar a superioridade judaica, mas deu-se conta de que isso já não fazia sentido. Chegou a hora em que os verdadeiros adoradores hão-de adorar o Pai em espírito e verdade, pois são assim os adoradores que o Pai pretende. Deus é espírito; por isso, os que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade.
Ainda hoje, 2020, se procura vencer a violência louca em nome de Deus por meio do diálogo inter-religioso. É a única alternativa defensável. Acontece, porém, que, em muitos desses diálogos, cada um dos intervenientes não vai além de manifestar aquilo em que está de acordo e o que julga inaceitável. Raros são os que fazem a autocrítica das instituições a que pertencem. Os diálogos repetem-se, mas não fazem avançar para uma nova plataforma que os transfigure e transfigure as suas problemáticas religiosas.
O insólito encontro da samaritana com Jesus venceu os preconceitos de que ambos partiram. A mulher pressente em Jesus o Messias esperado e ele confirma-o. O espantoso é que ela abandona o cântaro. Tinha encontrado outra água e vai a correr à cidade levar a boa nova que descobriu. Não pede que acreditem nela. Vai apenas dar o seu testemunho, levantar uma séria interrogação messiânica e propor aos seus conterrâneos que sejam eles a verificar. Foram e pediram a Jesus que ficasse com eles. “Então, muitos mais acreditaram nele por causa da sua pregação e diziam à mulher: Já não é pelas tuas palavras que acreditamos; nós próprios ouvimos e sabemos que Ele é verdadeiramente o Salvador do mundo.” É a única vez que esta confissão pública e solene aparece no Evangelho de João.
A conversa sobre o papel das mulheres na Igreja não avança porque não se liga nada à importância que Jesus lhes atribuiu.
P.S.O Evangelho de João é o mais sacramental. É também o da maior revolução religiosa, como vimos. Dadas as circunstâncias da covid-19, não seria de estranhar que a Conferência Episcopal Portuguesa cancelasse as celebrações da Quaresma e da Páscoa que manifestem riscos de contágio. O culto em espírito e verdade não depende das celebrações litúrgicas. Em Lucas, também há um contraste ético entre os zeladores do templo que viram e não ligaram e o herético samaritano que viu e socorreu (Lc 10, 29-37).
____________________
[1]      Para quem desejar conhecer a história do povo samaritano, a Wikipédia é muito abundante na informação, referindo as fontes em que se baseia
[2]      Lc 9, 52-56
[3]      Mt 10, 5-6; Act 8, 5; 13, 44-47
[4]      Gal 3, 27-28; Cl 3, 11



segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Que irão fazer no futuro?





[…]

Racismo e manifestações racistas são consideradas crime público.
Da entidade X à Y, do senhor(a) A ao B, do presidente da assembleia geral K ao presidente Z todos tomaram conhecimento da ignomínia racista que mais uma vez se estava a passar num campo de futebol. E, então…?!
Ah! Estavam lá os agentes da autoridade e os seguranças. Sim!? O que é que fizeram? Então, não é crime público…?!
Ah! A FIFA e a UEFA recomendam (proíbem) imagens de violência ou chocantes. Nada de pôr em risco a boa imagem desportiva, que não existe. Paga-se uma multa – e até é bom, pois enriquece os cofres –, mas o valor até é pequeno: meia dúzia de euros. Não penaliza.
Estou farto que se tape o Sol com a peneira. Isto tem sido nos estádios desportivos… e o resto, as constantes discriminações rácicas na sociedade portuguesa?!
Onde está o nosso grito de revolta?!!
Ficamos muito indignados quando vemos na imprensa estrangeira a constatação de que os portugueses são racistas. Eu fico muito indignado, não pelo que afirmam, mas porque é verdade. A brincar, a brincar manifestamos avulsas manifestações racistas. Isto é verdade.
Ontem conseguiram irritar-me!
Fico, todavia, com uma dúvida: que irão fazer…??

[…]